quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Biblioteca: O mal de Montano (Enrique Vila-Matas).

Se não tivesse esposa ou filho, me dedicaria, talvez, ao ofício que tanto me faz sofrer ao tê-los. Já que os tenho, sofro, fujo, escrevo, divago e apago (não sei o quê ou quem) – me encontro a partir do momento em que perco minhas referências – sou humano, e por essa condição tão essencial, deixo que minha doença me aniquile, aos poucos, através da iníqua exigência que fizeram para o meu bem; de qual bem? Escrevo para eternizar; silencio para continuar; não sei até quando?


O mal de Montano (Enrique Vila-Matas).

Biblioteca: Bartleby e companhia (Enrique Vila-Matas).

Se há alguma razão para a vida, que ele não tenha como objetivo a eternidade. Imagino se a nós fosse dada a oportunidade de viver, e através de um ato denegatório, não aceitássemos tal incumbência por pura preferência: “não”; então, seríamos uma folha em branco – invisível aos outros. Por outro lado, o “sim” é aceitar a tarefa de copiar - apenas copiamos sob a razão ou fé – nossas experiências; nossa percepção acerca da vida; entraríamos, então, na tarefa diária de transcrever, de forma ilegível, o original que a nós foi confiado. Há a possibilidade de dizer “sim” para depois proferir um “não” pelo simples prazer de não deixar prevalecer a sua vontade; muito menos a minha.


Bartleby e companhia (Enrique Vila-Matas).

Biblioteca: Doutor Pasavento (Enrique Vila-Matas).

Um dia desses vi na TV uma entrevista dada por mim a um jornal diário. Naquele instante, me senti menor frente à imagem projetada pelo televisor. A partir daquele momento, questionei, a mim mesmo, minha existência; estava sozinho, e assim gostaria de permanecer para todo o sempre. Quem mais desejaria a minha presença, a não ser eu; já que não sou boa companhia - senão, onde eles estariam – prefiro ficar sozinho, junto de mim. Eles já têm tudo: livros, entrevistas e fotos; é o bastante. Não sou nada frente ao que construí, sendo assim, tudo o que fiz, um dia não significará nada.


Doutor Pasavento (Enrique Vila- Matas).

Biblioteca: A viagem vertical (Enrique Vila-Matas).

Uma noite eu sonhei que estava prestes a me suicidar. Estava à beira de um precipício. Aliás, eu era E1; o eu na beira do precipício era ES1; havia outro eu morto no chão, estava identificado por ES2; na mesma cena, havia outro eu flutuando no ar e observando tudo, se fazer nada, era ES3; um quarto eu – ES4 – estava correndo, o seu objetivo era empurrar o ES1 para a morte, a fim de que ele se juntasse ao ES2; o ES5 tentava impedir, em vão, o ES4 de concluir o seu plano; o ES6 estava na beira da cama e tentava me acordar do sonho; então, eu lembrei que o ES7 havia me dado vários comprimidos para eu – E1 – dormir; não tive dúvidas que era hora de acabar com tudo aquilo, antes de uma tragédia; só não sei a quem impedir primeiro.


A viagem vertical (Enrique Vila-Matas).

Biblioteca: Dublinesca (Enrique Vila-Matas).

O mito morreu, e com ele, tudo o que vale a pena. Atravessei séculos e não vi nada de genial. Encontrei a todos e por fim não encontrei ninguém (pai e filho); a menos que eu não os tenha percebido como tais. Regressei ao nada e concluí que a mediocridade está em mim, por haver dedicado toda minha vida por uma busca infundada. De tudo, só resta a real evidência de que os objetivos decaem para o fim; não para o fim e sim para um fim.


Dublinesca (Enrique Vila-Matas).